O Lápis Azul

Há uns dias atrás, mais precisamente dia 14 de Setembro de 2010, surgiu um comunicado emitido pela Associação do Comércio Audiovisual de Portugal – ACAPOR – onde se anuncia um procedimento administrativo com vista ao bloqueio do acesso em Portugal aos sites The Pirate Bay e PirataTuga. No mesmo comunicado é enunciado o Decreto-Lei n.º 7/2004 que transpõe para o ordenamento jurídico português a Directiva 2000/31/CE, que visa dar poderes ao IGAC — Inspecção Geral das Actividades Culturais para interromper a actividade de sites que prejudiquem gravemente os consumidores, aí incluídos os investidores, como é o caso manifesto do Pirate Bay, acusados pela responsabilidade na colaboração na realização de biliões de “downloads ilegais” e na partilha não autorizada de diversas obras culturais e intelectuais. É também indicado uma requisição ao Ministério Público para a abertura Pirata vs Consumidorde um inquérito com vista a identificação e acusação criminal dos responsáveis pelo site PirataTuga.

O que o comunicado não diz é que o modelo de negócio dos membros da ACAPOR está moribundo não por causa da partilha de ficheiros online mas principalmente pelos seus concorrentes comerciais directos já estabelecidos pelos próprios provedores de serviços online. Basta consultar os videoclubes do MEO, da ZON, da Clix, da Vodafone, e outros que tais, para se perceber que, tal como em qualquer outro tipo de negócio, o comodismo associado é arrasador quando confrontado com o ter de se deslocar fisicamente um videoclube para requisitar um filme, que até pode lá não existir ou estar alugado nesse momento, e ainda ter de lá voltar para o devolver.

Alem disso os DVD’s são por si só também um entrave à experiência do utilizador, como exemplificado numa famosa imagem comparativa e à qual agora se pode aliar uma nova:Propaganda videoclubes

A ACAPOR tem com estas medidas um comportamento de avestruz moribunda, que ao mesmo tempo enfia a cabeça na areia, ao ignorar o verdadeiro “inimigo”, e ataca, qual animal ferido, o que mais lhe está à mão e mais lhe apazigua o pânico de se confrontar com a sua extinção eminente.

Também não consegue compreender a inutilidade de tentar bloquear sites como o Pirate Bay (que actuam apenas como motores de busca mais especializados, não contendo eles próprios nenhum material) uma vez que essas funcionalidades são disponibilizadas por inúmeros outros e inclusive pelo maior de todos, o Google! (e para quando um pedido para o bloquear também?)
Se as mentes retrogradas por trás deste tipo de iniciativas de censura ridículas tivessem um bocado mais de sensibilidade comercial talvez conseguissem entender que quem utiliza a partilha online dificilmente ou até nunca seria seu cliente caso esta fosse banida, voltando-se antes para a gravação a partir da TV ou pela partilha directa entre amigos como é feita desde tempos imemoriais. Talvez conseguissem perceber que o seu mercado são aquelas pessoas que não estão para essas chatices da Internet e dos computadores, que querem é sentar-se calmamente no sofá da sala a ver o seu filme sem grandes complicações e estão dispostas a pagar por isso. Talvez conseguissem acordar para o facto de que foram ultrapassados pela própria TV que agora fornece a estes clientes videoclubes em forma de telecomando e à distancia de um botão. Talvez conseguissem admitir que foi a sua própria inactividade e falta de visão que deixou o espaço aberto para que esse lugar na TV fosse ocupado pelos fornecedores de IPTV.

AvestruzInfelizmente, como todas as mentes retrogradas o comportamento é sempre o mesmo. A industria musical quando confrontada com o Napster só descansou quando o destruiu, e com isso só conseguiu multiplicar exponencialmente os sítios de oferta gratuita e perder o comboio da oferta comercial, que chegou com o iTunes. A ACAPOR consegue fazer pior…já perdeu o comboio comercial e mesmo assim ainda se concentra naquilo que nunca conseguirá destruir e sim multiplicar com a sua publicidade gratuita.

Estes alegados processos apenas visam criar mediatismo e não proteger o consumidor. Recorrer aos tribunais com o objectivo de lançar a confusão e intimidar as pessoas revela uma profunda falta de respeito para com as instituições democráticas. A justiça portuguesa não necessita de ser mais descredibilizada do que já está.
Mesmo que a censura ao Pirate Bay e ao Pirata Tuga se venha a concretizar o fácil acesso estes sites e respectiva informação continua a ser possível, uma vez que os ficheiros não estão alojados em quaisquer sites de hospedagem de arquivos mas sim numa rede descentralizada de utilizadores. Ou seja trata-se de uma acção sem razão de ser e sem pernas para andar, acabando por se tornar apenas um vago acto de censura.

Esta insistência em censurar o P2P por supostos danos é uma tentativa vã de enganar os portugueses e evitar que estes ingressem no novo paradigma de acesso à cultura. A partilha online permite difundir amplamente as mais diversas obras, o que provoca um enriquecimento cultural nunca antes visto. No entanto como este serviço é feito gratuitamente, entidades como a ACAPOR não compreendem este fenómeno de partilha na medida em que não lhes interessa que todos tenham acesso à cultura de forma livre e gratuita mas sim que o acesso à cultura esteja dependente do seu próprio lucro.

No mesmo comunicado gabam-se de serem a primeira entidade portuguesa a requisitar um bloqueio de sites alojados fora do país. Não só esta afirmação é falsa, como prova pelo menos uma de duas realidades, se não as duas em simultâneo: Ou a ACAPOR está tão desligada da realidade que a rodeia a ponto de se permitir a esta afirmação que a ridiculariza ainda mais; ou a ACAPOR mostra como está disposta a mentir com todos os dentes, que já não tem, em qualquer aspecto que torne o comunicado mais sensacionalista, comprometendo todo e qualquer argumento aí contido. Alie-se a isso o orgulho mostrado em erguer o grande lápis azul da censura internacional, e temos revelada a mentalidade mesquinha e retrograda de quem só sabe reagir às adversidades com proibições, de quem não sabe evoluir com os tempos e adaptar-se às novas realidades.
Mas a esta medida está reservado o sucesso dos mesquinhos, e ao invés de uma “Great Firewall of China” ou similares da Coreia do Norte e Irão, esta falsa iniciativa em nome da protecção dos lucros da afamada “propriedade intelectual” nem uma barragem de palitos irá conseguir erguer que impeça o fluxo cultural livre que a Internet proporciona.

Nota de redacção: “P2P” refere-se à palavra estrangeira “peer to peer” (ponto a ponto em português), o conceito por detrás de inúmeras tecnologias e protocolos de partilha de ficheiros e informações.


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