Metáforas (ou censura para totós).

A Transportation Security Administration (TSA) faz parte do Department of Homeland Security. Foi criada depois dos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 para assegurar a segurança dos transportes nos Estados Unidos. Há uns dias disponibilizaram uma versão do seu manual de operações num site governamental sobre oportunidades de emprego e, para não divulgar elementos críticos dos seus procedimentos de segurança, censuraram partes do documento. Para isso acrescentaram ao ficheiro .pdf uns rectângulos pretos sobre o texto a censurar, impedindo toda a gente de ler esses trechos desde que não saiba seleccionar, copiar e colar (1). Porque o texto todo continuava lá, debaixo dos rectângulos.

O problema é comum. Muita gente não percebe que aquilo que vê no computador é fictício. São metáforas(2). Janelas, desktop, a distinção entre ficheiros de imagens, de som ou texto, as pastas, as ligações para “ir” de um sítio para o outro. É tudo faz de conta. São só filas de números. O monitor cria a ilusão de tinta no papel mas essa é apenas uma de muitas formas de representar os bits do ficheiro. E o rectângulo preto por cima é só mais uns números.

Isto vai mais fundo que a incompetência de alguns funcionários públicos. Os legisladores proíbem a alteração de software por parte do comprador e punem a neutralização de restrições digitais. Mas estas acções consistem apenas em fazer contas e substituir valores em listas de números (3).

As regulações que tratam o download de uma maneira e o streaming de outra baseiam-se também na ilusão de uma diferença onde não há nenhuma. Em ambos os casos o nosso computador recebe uma sequência de bytes e guarda-a localmente. A diferença está apenas no utilizador, que no caso do streaming desconhece onde o ficheiro ficou guardado (4). Por outro lado, as metáforas da interface levam o legislador a confundir as sequências de números que descrevem uma obra com a obra em si. Mas a relação entre esses números e a obra é meramente convencional. Tanto podem representar algo semelhante ao que o autor criou como algo completamente diferente (5).

Não devia haver dúvidas. Como os nomes indicam, ficheiros digitais são números e computação é fazer contas. Mas a bonecada de janelas, e a aparência de coisas familiares como papeis escritos, filmes e canções, vai continuar a enganar muita gente. Ao mesmo tempo que aumenta o custo da confusão. Não só para a carreira de funcionários menos cuidadosos e para algumas empresas de distribuição, mas também para a sociedade e para as liberdades de todos nós.

1- Wired, TSA Leaks Sensitive Airport Screening Manual, e BoingBoing, TSA can’t redact documents properly, releases s00per s33kr1t operations manual. Via Schneier on Security

2- Neal Stephenson, In the Beginning was the Command Line.

3- Um exemplo antiguinho, a profissionalização do Windows XP Home Edition.

4- Se usarem o Opera para ver um vídeo no YouTube, por exemplo, vão à pasta “Operaprofilecache”, ordenem por data de modificação, e o ficheiro maior entre os mais recentes é o vídeo. Basta copiar para outro lado qualquer e acrescentar a extensão .flv.

5- O Photosounder é um programa que interpreta imagens e sons indiscriminadamente, usando uma representação gráfica dos sons que permite ouvir fotografias como música ou ver música como imagens. E aqui (.pdf) um artigo sobre recuperação de música gravada em discos de vinil usando uma câmara de vídeo e processamento de imagens digitais.

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